sexta-feira, 27 de março de 2015

Impressões: últimos contos do mês de Março


Fechando a leva de contistas brasileiros, deixo abaixo meus comentários sobre quatro contos de diferentes autores. A experiência foi super válida, concretizei o objetivo principal, que era conhecer o trabalho de autores notórios através de leituras curtas, e voltei a consumir literatura brasileira, que nos últimos dois meses estava afastada do meu cotidiano (exceto por um conto de Machado de Assis). O mérito do projeto é ainda maior, pois agora tenho guardada uma lista com outros autores contemporâneos que não entraram na série de posts por questão de tempo ou por não terem contos entre suas obras, mas que serão lidos EM BREVE. Sem mais enrolação, vamos às impressões:



Eu, a sogra foi meu primeiro contato com o trabalho de Giulia Moon e foi uma delícia! Um conto carregado de comicidade muito bem dosada, com uma narrativa fluída em primeira pessoa e uma situação extremamente comum a qualquer pessoa que já passou um feriado reunido com a família. A mistura de magia e culinária é feita de maneira bastante natural, e a eventual retidão em acreditar numa magia tão cotidiana é dispersada pelo tom bem-humorado da história. O desfecho do problema é muito conveniente e apropriado ao estilo, e me deixou com uma estranha vontade de ver a história adaptada para a TV. Eu riria de novo, com certeza.



Por um punhado de almas é mais um conto de Cirilo S. Lemos, que teve seu post exclusivo aqui no blog há uns dias. Com um estilo diferenciado e uma voz narrativa já estabelecida, o autor não falha em entregar algo único, não importa quantas referências se escondam entre suas palavras. Particularmente, viajei entre Afro Samurai e o pistoleiro sem nome da Trilogia dos Dólares enquanto acompanhava a narrativa não linear do conto, não sem travar em algumas figuras de linguagem forçadas pelo caminho. Infelizmente, a narrativa fragmentada, aliada aos personagens sem construção profunda - embora sejam caracterizados fisicamente com descrições marcantes e bem pensadas - tornou a leitura desconexa, só fazendo sentido no final; ao terminar, senti uma verdadeira frustração. Com cenas bem montadas e apresentação de personagens diluída demais no enredo, muitas vezes um bom final é o bastante para redimir uma leitura arrastada. Neste conto, apenas explica a história, sem gerar muita satisfação.



O xenólogo de Sírius, novela de Antonio Luiz M. C. Costa chega representando a ficção científica na seleção, e, quase que perpetuando a minha relação problemática com o gênero, foi abandonado. A história trata da relação do povo de Sírius com outros povos de planetas diversos, - sejam eles desenvolvidos tecnologicamente ou não - que é basicamente uma situação de vigilância e monitoramento das espécies. A sinopse indica que há mais, porém o início do conto se encarrega de impedir o avanço de leitores não tão aficionados pelo gênero. O contar, e não mostrar - que é um estilo de escrita, e não um defeito de narrativa, como muitos na internet insistem em dizer - é absoluto, e associado à distância que é colocada entre as personagens e o leitor, quebra qualquer possibilidade inicial de identificação; a impressão que fica é de estar lendo um registro histórico muito longínquo. A falta de diferenciação de gênero, que serviria como recurso ortográfico para definir um aspecto cultural, se perde quando surgem outras palavras flexionadas pelo gênero, e a ideia se torna um mero enfeite mal aplicado. Por outro lado, a pesquisa científica é vasta e profunda, perceptível por menções que vão de conceitos evolutivos a posicionamento orbital; talvez, somado a referências interessantes a outras obras consagradas da FC, isto consiga empolgar os fãs mais apaixonados pela ciência e os encoraje a vencer o infodump, que acabou por me derrotar um pouco antes da metade do conto.



Thorn Punho de Ferro é um conto de Celly Nascimento e encerra o post (e o mês) com um ar fúnebre. A narrativa em terceira pessoa conta os últimos sonhos, pensamentos e devaneios de Thorn, um adolescente moribundo caído no meio de destroços de um campo de batalha. É incrível como em poucas páginas a autora criou um background tão amplo e crível de um mundo fictício. Os medos e esperanças perdidas do protagonista realmente convencem, apesar de alguma artificialidade na escrita. O estilo da autora é bom, vê-se que ela entende como descrever e narrar, mas peca na imaturidade, talvez. Advérbios e adjetivos lotam os parágrafos, muitas vezes não sendo precisos e tornando algumas passagens confusas ou mal aproveitadas. Frases de efeito, um dos recursos que mais odeio, também estão presentes e me decepcionaram um pouco, apesar de saber que é um artifício muito usado e bastante aceito por leitores de fantasia. Ademais, o texto é surpreendente para a estreia de uma autora, e com certeza define um potencial que merece ser observado no cenário nacional de fantasia.




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