sexta-feira, 29 de julho de 2016

Impressões: Coisas frágeis 1, de Neil Gaiman

Peguei este livro para curar uma ressaca literária e ele só a intensificou. Passei dois meses ou mais sem ler ou escrever qualquer coisa, e sempre que o pegava para retomar o ânimo ele me afundava mais na preguiça de estar entre palavras. Minhas impressões sobre Coisas frágeis 1, de Neil Gaiman, logo abaixo.



Os nove contos de Coisas Frágeis trazem Gaiman abordando os mais diversos temas, misturando puberdade, punk rock e ficção científica em "Como Conversar com Garotas nas Festas"; combinando o Sherlock Holmes de sir Arthur Conan Doyle com o terror de H. P. Lovecraft em "Um Estudo em Esmeralda"; extrapolando o mundo de Matrix em "Golias", inspirado no roteiro original do primeiro filme; ou mesmo presenteando a filha mais velha com um conto fantástico sobre um clube de epicuristas em "O Pássaro-do-Sol". Coisas Frágeis é um tratado prático de como escrever boas histórias - histórias que, como diz a introdução do livro, "duram mais que todas as pessoas que as contaram, e algumas duram muito mais que as próprias terras onde elas foram criadas". 


Um estudo em esmeralda é uma história divertida, fiel à estrutura narrativa e ritmo que consagraram Sherlock Holmes no mundo da ficção policial. O "esmeralda" do título remete aos deuses antigos criados por Lovecraft, que na história são mostrados através de referências um pouco menos destacadas. Neil Gaiman une esses elementos para contar a busca de um detetive e seu companheiro pelo assassino de um membro da realeza. Um ótimo conto, sob qualquer perspectiva, mas especialmente apreciado aos que conhecem as fontes inspiradoras. Eu, que sou fã extremista e declarado de Lovecraft e Doyle, só posso dizer que terminei a leitura com um riso delicioso no rosto. Recomendarei sempre.

A vez de Outubro é um conto muito bom, que mostra a reunião dos meses do ano ao redor de uma fogueira para contar histórias e desenvolve, na fala de Outubro, a fuga de casa de um menino descontente. Fiz muitas ligações com O oceano no fim do caminho (também conta a história de um menino perturbado e é o melhor romance do Gaiman, na minha opinião), e provavelmente por conta disso fui destacando uma coisinha ou outra para criticar. No geral, a história é interessante, mas fiquei com aquela impressão de ser alinhada demais com o público que partilha das tristezas do menino. Acho que o adulto que se envolveu demais com a história precisa realmente tomar tenência e resolver suas inseguranças, de uma vez por todas. Isso soa insensível, mas é sincero; o conto tem muita cara de mensagem pastoral, foi impossível não associar Outubro com a voz forte e suave daqueles pastores que pregam em quadros noturnos das rádios, tentando motivar os que caíram em desgraça.

Lembranças e tesouros é um caos. Conto cheio de coisas soltas e apressadas que, tal qual fiz quando li Lugar nenhum, tive a boa vontade de relevar "por ser Neil Gaiman". Mais à frente tem outro conto com Smith e Alice, e espero gostar mais, pois nesta história eles não me envolveram nem um pouco - e mesmo assim foram as melhores coisas que tirei da narrativa desordenadamente desconexa.

Os Fatos no Caso da Partida da Senhorita Finch é um conto divertido, despretensioso, cheio de bons personagens e com a adição da popular ideia da "Londres abaixo", aqui representada por um circo que se apresenta em galerias abandonadas do metrô. Não há muito mais o que dizer, é um conto muito bom. Recomendado!

O Problema de Susan é o maior sonífero que já experimentei. Por duas semanas tentei e falhei em chegar à quarta página. Gostaria de dizer que esse conto é uma bosta, mas por polidez vou dizer que Neil Gaiman estava possuído por Morfeu quando o escreveu.

Golias é um conto interessante contado no universo Matrix. Não lembro muito dele, mas é bom.

Como Conversar com Garotas em Festas é um caso interessante. Começou maravilhosamente, me empolgando com a voz narrativa do protagonista e a situação proposta, mas lá pelo meio (quando a festa acontece) há uma página lotada de referências regionais que me lembrou muito o que li de Stephen King e, imediatamente depois, tudo se transformou numa narrativa louca. Talvez haja algum simbolismo na parte final, e se alguém souber justificar o porquê da história ter ficado como ficou, me explique para eu poder tirar proveito do que se iniciou como uma ótima história e degringolou completamente com a aparição das amigas de Stella.

O Pássaro-do-Sol é um bom conto e leva a impressão digital do autor em sua narrativa: a história é carregada de infantilidade e pontualmente joga ganchos para o leitor adulto lembrar-se de que é adulto. Em geral prefiro quando ele faz isso com alguma justificativa, como por exemplo haver personagens crianças na trama (o que não é o caso aqui, e houve a incômoda dúvida sobre a história ser direcionada a crianças ou adultos, que afeta diretamente a suspensão de descrença), mas não prejudica o conto em seu todo. Terminei de ler querendo muito ver um curta animado baseado nele.

O Monarca do Vale é sequência de Deuses americanos e se assemelha demais com ele. No final, inclusive, me perdi quando começa a batalha, tal como aconteceu quando li o romance, mas fora isso não tenho o que reclamar. Ótimo conto e um excelente reencontro com Shadow.



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