domingo, 8 de janeiro de 2017

Impressões: A Menina - Uma vida à sombra de Roman Polanski, de Samantha Geimer



The Girl: A Life in the Shadow of Roman Polanski
Indo muito além das manchetes, A menina: uma vida à sombra de Roman Polanski revela uma garota de treze anos que era ao mesmo tempo muito mais esperta do que sua idade e, mesmo assim, terrivelmente vulnerável e ingênua. Mas, ao contar sua história completa pela primeira vez, Samantha reclama sua identidade, e indelevelmente prova que é possível ir de vítima a sobrevivente, da confusão à certeza, da vergonha à força.

A menina é um livro cheio de altos e baixos, com viradas e piruetas entre eles. Comecei porque estava afim de ler uma não-ficção, e como era o que eu tinha à mão, acabei lendo unicamente para não ter que gastar dinheiro comprando uma biografia de alguém que conheço. Digo isso porque não conhecia a autora, nem sequer conhecia o pivô de tudo, Roman Polanski. Mas era o que tinha para hoje, então li. 

O livro conta a versão da autora sobre partes da sua vida envolvendo o caso de estupro que sofreu na mão do diretor de cinema e pormenores não tão relacionados assim com o evento. Achei interessante o livro pela sua naturalidade narrativa, até mesmo no início, antes do relato do estupro, o que me fez lembrar que até a mais banal das histórias cotidianas pode ser interessante. O estilo de escrita é inexistente; de fato, a escrita é praticamente uma transcrição de discurso oral, quase vulgar. O aparecimento de recortes de jornal ou de documentos do processo no texto do livro destoam, mas isso não influencia muito na percepção do livro enquanto obra literária, muito pelo contrário. Por conta deles, o livro acaba sendo ainda menos literário (no que tange à arte), mas em nenhum momento achei que essa fosse a aspiração da autora. 

O destaque, na minha opinião, é o posicionamento da vítima sobre o crime de estupro. Fiquei chocado com o que li no livro, e após uma análise interna, entendi o porquê. De uns anos para cá, algumas pautas políticas acabaram norteando a produção de conteúdo de entretenimento, e o tema "estupro" foi levado junto com isso. Hoje em dia ele se tornou um tabu muito grande (na literatura, em especial, é até razão para revolta e textão no blog), e a leitura do livro me alertou para o fato de eu ter sido sugado para essa corrente de pensamento comportamento. Ver um caso (que aconteceu na vida real, ainda por cima) em que uma vítima de estupro não coloca o crime como a coisa execrável, repudiante e hedionda que normalmente eu vejo em 100% dos posts/artigos de opinião na internet que abordam o tema, teve o mesmo efeito de um soco na cara. Eu poderia vir aqui e dizer que o livro foi uma perda de tempo, enquanto leitura de lazer, mas essa libertação que ele me trouxe foi muito engrandecedora. Agora eu consigo pensar no tema com a complexidade que ele exige, saindo da bitolagem na qual eu me encontrava, rotulando representação de estupro como humanizado ou não, favorável ou não para o debate público sobre o tema, e outros tantos chavões que acabei repetindo quase que por osmose.

O livro é dispensável, não acho que alguém PRECISE ler, a não ser os fãs do diretor ou pessoas que tenham se interessado pelo caso que se arrastou na justiça americana por décadas. De uma forma ou outra, ainda é mais útil que certas bobagens aclamadas na literatura de fantasia que eu vinha admirando, desprezando ou querendo ler, mas que não passam de enlatados produzidos em massa seguindo as mesmas fórmulas estruturais. 



O livro pode ser adquirido através do link abaixo, e eu receberei uma porcentagem da venda: