sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Impressões: Revista Trasgo #3


Cá estamos com a terceira edição da Revista Trasgo. Confesso que houve certa decepção durante a leitura; ainda que ao final meu veredito seja positivo, alguns contos desta edição não me cativaram como eu esperava, especialmente se a leitura for comparada às edições #1 e #2. O formato é o mesmo: fiquem com a capa e as minhas breves considerações sobre cada conto.

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O primeiro conto que li foi Rosas Brancas, de Roberto de Souza Causo e já iniciei a edição fora da zona de conforto. Meu gosto para ficção científica é bastante restrito, prefiro quando o texto se mantém ficção científica a quando se apresentam mais como ciência ficcional, se posso assim diferenciar. A narrativa do autor é muito bonita, com toques de poesia aqui e ali, e a trama se desenvolve agilmente com pitadas de amores destruídos (maternal e conjugal). Mas aí vem a ciência especulativa, cheia de termos e extrapolações que particularmente vejo como o floreio desnecessário nas histórias futuristas (mas, como diz uma amiga minha, fazer o quê?). Aos apreciadores desse tipo de inserção tecnológica em histórias, provavelmente o conto será muito bem vindo com a sua temática orgânico-cibernética.

Retornei ao início do ebook para ler o primeiro conto da edição: O empacotador de memórias, de Gael Rodrigues. O meu motivo para ter pulado o conto é bastante particular: eu tenho um problema de falta de memória, e é muito, muito raro (mas não impossível) eu acabar gostando de histórias com esse tema, justamente por tratar de um tema que afeta bastante (negativamente, devo frisar) a minha vida. O conto mostra a infância e vida adulta de um homem solitário que descobriu como guardar memórias em bolhas de sabão e caixas de papelão. A escrita é bem tranquila, mas a narrativa exige algumas abstrações, fazendo o leitor se perguntar o significado de uma memória e o que ela afeta o que ele é ou já foi na vida. O final achei bem intrigante.

Feita de um sonho é o terceiro conto da revista, e é de autoria de Caroline Policarpo Veloso. Este conto foi o que me impulsionou a continuar lendo, ao invés de desligar o Kindle e postergar a leitura (algo que faço muito quando leio coletâneas de contos). O tema me afetou de maneira oposta à leitura anterior, uma vez que eu sou um onironauta (ainda que tenha poucas viagens completadas com êxito) e falar sobre sonhos - lúcidos principalmente - é algo que gosto muito. Caroline me presenteou com uma escrita super fluída e uma história com um ritmo sensacional que nos faz pensar sobre a correria cotidiana, nossas inseguranças (in)conscientes e a importância que um sonho pode ter na vida pessoal. O aspecto fantástico do conto acabou ficando diluído, sem tanta importância, mas no final a dose de fantasia foi incrementada, deixando-me satisfeito. Infelizmente fiquei com a sensação de que o conto ficou inacabado; não sei se a autora pretende expandir essa história, mas se acontecer,.com certeza é algo que eu comprarei.

Pulei novamente a ordem da revista para o conto Viral, de Tiago Cordeiro. A história nos mostra uma abordagem diferente sobre uma infestação zumbi, e apesar de achar muito criativa a forma que ele deu à essa infestação, o transcorrer da história não me agradou. atribuições matemáticas e sonoras aparecem no conto junto a vários outros elementos jogados num enredo corrido e inconclusivo. Não chamaria de formal, mas a escrita do autor me pareceu automática, e, sem ser cativado, terminei a leitura sem muita vontade de pensar sobre o que tinha acabado de ler.

Voltei para páginas anteriores e encontrei Invasão, de Cláudio Parreira. O texto é simplesmente GENIAL, comédia sensacional que eu não posso falar muito a não ser dizer que é foda e que me diverti bastante lendo. Gostei tanto da trama quanto da escrita do autor, mas para não dizer que só falei bem, me sinto na obrigação de informar uma coisa ao autor: Regiane Alves>>>>Bruna Lombardi.

Para finalizar, o conto O vento do oeste, de Liége Báccaro Toledo. Uma história de fantasia com inspiração nos mitos árabes e ambientação desértica, onde conheceremos parte da vida de um mestiço que busca um lugar onde sua descendência demoníaca não seja motivo de ódio e rejeição. O enredo é legal, mas muito centrada no desenvolvimento do personagem e, até a parte mais avançada, sem muitos motivos externos para fazer a trama seguir. Felizmente a escrita da autora é simples e estimulante, o que compensou a minha vontade de fazer pausas e pude terminar de ler sem interrupções.


A edição #4 já está disponível NO SITE e comecei a ler hoje cedo.  =)


Impressões: Bukowskianos, de Murillo Magaroti


No embalo da leitura, vou quebrar minhas regras textuais e fazer a resenha ao estilo Bukowskiano. Nada de tópicos com pontos positivos ou negativos – fazer o quê? Gosto de listas, e você também, aposto! Em Bukowskianos, Murillo Magaroti oferece um verdadeiro trabalho de fã, e isso não é só evidenciado no título; segue a sinopse:


Bukowskianos traz 43 pequenos contos que falam principalmente de gente sem muito brio, bebidas, escritores e da complexidade em tudo na vida. São contos que passeiam pelo mundo da crônica e que fazem inúmeras referências à obra do escritor Charles Bukowski.

Não só a temática que se assemelha, a estruturação gramatical é constantemente voltada à quebra de regras, gerando um texto amorfo que preza a liberdade para o autor e do leitor. O que obtemos disso é uma leitura ágil, fácil e bastante coloquial, que muitas vezes consegue estapear o leitor no rosto e dizer ESTÁ VENDO? VOCÊ SE IDENTIFICOU COM ISSO, NÃO FOI, SEU VAGABUNDO?!

O estilo de Magaroti é claramente mais que inspirado, é uma simulação de Bukowski. Isso pode ser recebido de duas formas. A primeira é a falta de voz do autor, o que pode ofender os de coração mais romântico e artistas por natureza, ainda que não por profissão. A segunda – que deixo claro ser a minha visão – é que, ainda que mimética, a escrita é MUITO BOA; Bukowski era autêntico e escrevia bem, então é apenas normal confirmar o mesmo de Bukowskianos. Como já falei acima, o texto é muito bem trabalho tanto em temas quanto em estilo, vai ser muito difícil um fã do autor consagrado não gostar desta obra de Murillo.

Para não dizer que não vi nada de errado na minha leitura, achei que o pessimismo e a ebriedade das histórias sempre ficavam um pouco atrás da obscenidade, que era sim um traço marcante de Bukowski, mas ele não era só isso. Talvez seja só uma questão de dosagem.

No final das contas, Bukowskianos é um excelente trabalho, notável por ser o primeiro de Murillo Magaroti. Recomendo o livro a putas e vagabundos de todos os calibres.



sábado, 6 de setembro de 2014

Impressões: Mistborn - O império final, de Brandon Sanderson


O livro de hoje pulou na frente de muitos livros da lista de leitura, devido à quantidade exorbitante de indicações e de fãs e prêmios exaltando a maravilha que é. Infelizmente ninguém dizia que o livro é um juvenil/YA, e enquanto lia, minhas expectativas eram satisfeitas e não atendidas ao mesmo tempo, deixando a minha visão do livro bem inconstante. Vamos à sinopse:

O Império Final

O que acontece se o herói da profecia falhar? Descubra em Mistborn! Certa vez, um herói apareceu para salvar o mundo. Um jovem com uma herança misteriosa, que desafiou corajosamente a escuridão que sufocava a Terra. Ele falhou. Desde então, há mil anos, o mundo é um deserto de cinzas e brumas, governado por um imperador imortal conhecido como Senhor Soberano. Todas as revoltas contra ele falharam miseravelmente. Nessa sociedade onde as pessoas são divididas em nobres e skaa – classe social inferior –, Kelsier, um ladrão bastardo, se torna a única pessoa a sobreviver e escapar da prisão brutal do Senhor Soberano, onde ele descobriu ter os poderes alomânticos de um Nascido da Bruma – uma magia misteriosa e proibida. Agora, Kelsier planeja o seu ataque mais ousado: invadir o centro do palácio para descobrir o segredo do poder do Senhor Soberano e destruí-lo. Para ter sucesso, Kel vai depender também da determinação de uma heroína improvável, uma menina de rua que precisa aprender a confiar em novos amigos e dominar seus poderes.


A trama é bastante simples e extremamente rápida, como é de se esperar num livro juvenil. Nós acompanhamos Kelsier na sua luta, em um mundo apocalíptico dominado por brumas noturnas que abrigam mistérios e criaturas medonhas, contra um império maligno dominado pelo Senhor Soberano. O imperador, além de poderoso e imortal, mantém com mãos de ferro a sua sociedade feudal, em que nobres vivem em opulência enquanto a maioria da população é escrava e tratada como escória, seja no campo ou nas regiões urbanas. Tomamos conhecimento da vida de Kelsier como golpista e de seu grupo de companheiros vigaristas, empenhados na maior de todas as empreitadas: destruir o Império Final. Apesar de contar com um narrador impessoal, o leitor basicamente lê um livro de diálogos, pois é assim que toda a história transcorre, sem muita descrição ou narrativa, que, quando acontecem, são usadas, respectivamente, na apresentação inicial do ambiente da cena em que acontecerá o diálogo; e nas passagens de batalhas.

O elemento condutor da fantasia é a alomancia, uma alquimia metabólica que permite ao seu usuário - necessariamente descendente de nobres - retirar habilidades mágicas de metais absorvidos pelo corpo, e quando digo absorvidos, falo INGERIDOS no maior estilo EAT-MAN. Cada metal alomântico possui um tipo magia e o sistema de utilização é o mesmo de jogos de rpg, gastando "mana" até que precisem ser ingeridos novamente, e a intensidade do consumo pode ser dosado ao bel prazer do alomântico, o que contribui para o maior defeito do livro: a repetição.


Existe um problema sério de escrita, a repetição de palavras e expressões é a maior que já vi em qualquer livro. QUALQUER LIVRO. Na primeira página já se percebe isso, mas o problema vai mais longe: a condução da história é bastante didática, e constantemente vemos ideias e sensações sendo re-explicadas e reforçadas desnecessariamente, mesmo para um livro juvenil, e você se pega várias vezes tendo que ler de novo o quanto Vin é desconfiada de todo maldito novo personagem que entra em cena, ou do tamanho do poder do Senhor Soberano, ou a odiosidade que é a vida dos skaa (casta de escravos). Isso tudo somado ao "empurra e puxa" (termos de alomancia) constante para descrever minuciosamente cada ação dos alomanticos, mesmo depois do leitor já ter conhecimento do que se pode ou não estar sendo feito, deixou a história extremamente longa e cansativa. Se o autor já explicou que queimar peltre dá superforça, então se alguém usa superforça, é lógico que ele está queimando peltre, não precisava indicar isso em todo fucking movimento!

Essa parte da escrita de lado, o livro se mostra bastante agradável. Os cenários são bem montados, a escrita é sensacional, sendo bem direta e simples, o que é um favor que Mistborn faz à literatura de fantasia, que ainda se apega DEMAIS à uma construção poética e elaborada, que muitas vezes até prejudica o andamento do enredo. Os personagens são poucos e bem definidos, não dá para se confundir; pela quantidade de diálogos, o leitor logo pega os traços de cada um. Por um momento o autor até dá a impressão que vai tratar de temas mais sérios, citando Deus e os conceitos de bem e mal, mas a trama gira mesmo em função da rebelião dos escravos, e durante centenas de páginas o leitor vai descobrir esperança e conformismo, luxo e miséria, trapaça e inocência em Luthadel, a capital do império.

O que gostei:
- Personagens marcantes.
- Cenários envolventes.
- Enredo cativante, com algumas reviravoltas.
- Escrita ágil, fácil de prender o leitor.

O que não gostei:
- Escrita muito prolixa, o livro caberia facilmente sem retirar fatos do enredo, em menos de 400 páginas.
- Repetição demasiada de termos e ideias.

Considerações finais:
Mistborn é uma história agradável, porém cansativa. O estilo do autor favorece a velocidade de leitura, mas em contrapartida o montante a ser lido anula essa qualidade. A revolução de Kelsier começa e termina no livro, então a leitura é válida mesmo para quem não curte trilogias/séries. Não acho que vou ler os próximos, pelo mesmo motivo que deixei de ver animes, e é isso que Mistborn é: um anime transposto para 600 longas páginas.