Lá vem ele: meu ídolo nos quadrinhos e minha montanha-russa literária, cheia de altos e baixos, Neil Gaiman! Estou decidido a aumentar o número de livros lidos do Gaiman, e no começo do ano peguei O mistério da estrela: Stardust para ler. Segue a capa e sinopse.
Tristran ama a jovem mais bela do vilarejo de Muralha. Para ser correspondido, ele atende aos caprichos da moça e lhe faz uma promessa quase impossível de cumprir. Uma estrela cadente que ambos vêem cair do céu valerá a mão de Vitória em casamento.
A determinação de trazer a estrela para o vilarejo fará com que o rapaz burle todas as regras e siga para a Terra Encantada, onde supostamente a estrela está. Então, Tristran se vê cercado por piratas voadores, gnomos guerreiros, bruxas esquisitas e sedentas por beleza e princesas do mal. Um mundo de magia está diante dele e tem início um conto de fadas surpreendente e nada convencional.
Neste lugar, os caminhos podem ser belos e sombrios, tristes e alegres, suspeitos e óbvios, mas sempre cheios de segredos. E todos, não só Tristran, estão em busca daquela que parece guardar a solução para todos os problemas do reino mágico. Acontece que a estrela está triste e sem esperança. O maior desafio do jovem apaixonado, então, será fazer a estrela brilhar novamente.
A leitura foi difícil, MUITO difícil. Eu cogitei abandonar o livro várias vezes porque não me sentia compelido a continuar. É até estranho constatar isso em uma obra com tantos lampejos de talento ímpar, mas apenas de natureza estilística. Gaiman é um escritor delicado, mestre em gerar símbolos na narrativa e tornar vívidas as emoções dos seus personagens, isso é inegável. A voz então, é talhada de maneira tão natural, que o texto dele se revela em dois, três parágrafos no máximo. Não há como se enganar sobre a autoria do que ele faz. Mas isso não tornou Stardust uma história boa. Porque todo o resto faltou.
A proposta do livro é ser um conto de fadas para pessoas adultas, e com conhecimento disso, é até possível entender certos aspectos da narrativa, mas é imperdoável precisar sabê-lo para que o enredo se sustente. Quando não se aceita a proposta como muleta, os referidos "aspectos" se mostram verdadeiros defeitos, barreiras, enfim, INCÔMODOS que persistem do início até a última página. Informações soltas, caprichos, personalidades incompatíveis, tudo isso e um pouco mais será visto em Stardust, muito bem amarrado por construções frasais belíssimas e caracterizações que transbordam expertise de um veterano das letras.
A proposta do livro é ser um conto de fadas para pessoas adultas, e com conhecimento disso, é até possível entender certos aspectos da narrativa, mas é imperdoável precisar sabê-lo para que o enredo se sustente. Quando não se aceita a proposta como muleta, os referidos "aspectos" se mostram verdadeiros defeitos, barreiras, enfim, INCÔMODOS que persistem do início até a última página. Informações soltas, caprichos, personalidades incompatíveis, tudo isso e um pouco mais será visto em Stardust, muito bem amarrado por construções frasais belíssimas e caracterizações que transbordam expertise de um veterano das letras.
"Vaza de Scaithe é um pequeno porto marítimo, construído sobre granito, uma cidade de carpinteiros, fabricantes de velas de cera e de velas para embarcações; de velhos marujos com membros e dedos faltando que abriram tabernas próprias ou que passam o dia nelas, com o que restou de seu cabelo ainda preso com breu em rabos compridos, mesmo que a barba por fazer em seu queixo já há muito esteja salpicada de branco. Não há prostitutas em Vaza de Scaithe, ou não há nenhuma mulher que se considere prostituta, apesar de sempre ter havido muitas que, sob pressão, se descreveriam como muito bem casadas, com um marido neste navio que pára aqui de seis em seis meses e outro naquele outro navio que volta ao porto por cerca de um mês, de nove em nove meses."
"— Para dizer a verdade — disse Tristran —, espero passar o resto de minha vida como criador de ovelhas no lugarejo de Muralha, porque me parece que já passei por todas as emoções de que um homem poderia precisar, seja pelo acontecido com velas e árvores, seja pela moça e pelo unicórnio. Mas aceito o convite com o mesmo espírito com que foi feito e sou grato por ele. Se você algum dia chegar a visitar Muralha, deverá ir à minha casa, e eu lhe darei roupas de lã, queijo de ovelha e todo o ensopado de carneiro que conseguir comer."
"Cuidado onde pisa, cuidado onde pisa — repetiam as gotas de chuva ao bater na pedra. O unicórnio parou a cinqüenta passos da estalagem e se recusou a se aproximar mais. A porta da frente estava aberta, inundando o mundo cinzento com sua aconchegante luz amarela."
"Ali havia uma série de rostos que Tristran reconheceu, e as pessoas o cumprimentaram em silêncio, ou sorriram, ou não sorriram, à medida que ele atravessava a multidão e subia pela escada estreita por trás do balcão até o patamar, com Louisa sempre a seu lado. As tábuas rangiam sob seus pés. Louisa lançou sobre ele um olhar penetrante. E então seus lábios tremeram. E, para surpresa de Tristran, ela o enlaçou e o abraçou com tanta força que ele não conseguia respirar. Depois, sem dizer mais uma palavra, ela desceu correndo a escada de madeira."
Eu não vou elencar os pontos positivos e negativos do livro porque não estou encarando o post como recomendação (ou não) do livro, é mais um registro pessoal da minha experiência para futura consulta. Então vou encerrar de repente o meu texto, para dar uma de Neil Gaiman na época que escreveu essa aberração.
PS: Tive raiva também quando o safado encerrou com uma conversinha compreensiva a perseguição da vilã sanguinária aos heróis, mesmo depois de todo o ocorrido, mas pelo menos, a esta altura do livro, houve a jogadinha da "união dos domingos" para dar um toque de inteligência à trama. Já que a vontade de Gaiman era misturar o mundo adulto com o infantil nesse conto de fadas provocativo... Bom, ele teve sucesso: a dicotomia ficou evidente, ficou GRITANTE.
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