quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Impressões: A trilogia Dupin, de Edgar Allan Poe


O post de hoje um livro com três histórias, se trata de A trilogia Dupin, que tecnicamente nem deveria ter entrado na minha lista de leitura. Eu estava buscando algo de terror além de Lovecraft, e fui atrás da primeira coisa de Poe que surgiu na minha frente. Acontece que este livro é muito mais policial que propriamente terror, OU NÃO, pode ser que o terror de Poe seja totalmente pautado no estilo realista e policial (acabei de googlar e descobri que sim, ele tem muito terror fantasioso, mas a ficção policial também é muito presente em suas obras). Vamos à sinopse e em seguida minha opinião:

A Trilogia Dupin

O Dupin de "os assassinatos da Rue Morgue", "O mistério de Marie Rogêt" e "A carta roubada" é um personagem impagável. Nobre falido e excêntrico, Dupin se compraz em utilizar apenas seus agudíssimos recursos de análise e dedução para desvendar crimes que deixam impotente G., o Chefe de Polícia de Paris.
A Trilogia Dupin - Os Assassinatos da Rue Morgue; O Mistério de Marie Rogêt; A Carta Roubada.

No livro, acompanhamos o relato de um homem que resolve contar como conheceu Auguste Dupin, um excêntrico e extraordinário homem com capacidade analítica fora de série. Durante sua estadia em Paris, onde residiu com Dupin, o narrador tomou parte na solução de 3 casos notórios pelo seu engendramento ou aparente impossibilidade de ocorrer. É interessante notar durante a leitura como o raciocínio de Dupin é fantástico e certeiro, analisando evidências e corrigindo sem pudor autoridades policiais e nomes da mídia parisiense. Por serem casos de assassinato, há uma dose cruel e até insensível de impessoalidade nas descrições dos corpos ou cenas de crime, mas nada que vá tirar o sono de alguém. Os personagens são pouquíssimos e quase nenhum além de Dupin é realmente explicado, o que faz sentido quando se percebe que todo o livro gira em torno da capacidade analítica dele e dos meios que usa para encontrar a verdade, algumas vezes sem sequer precisar levantar da poltrona.

As três histórias são claras, escritas com um vocabulário extenso e às vezes específico da ciência forense. O ritmo, no entanto, é inconstante, pois muito do caso analisado ou da relação entre o narrador e Dupin é interrompido para discussões sobre pragmatismo, vícios e a mentalidade analítica e probabilística na busca de solucionar crimes. Essas divagações não são enfadonhas, pelo contrário, fazem o livro ter a qualidade espetacular que apresenta, mas especificamente no segundo texto, O mistério de Marie Rogêt, tomam proporções absurdamente longas e acabam cansando a leitura, pois este conto é montado apenas com as tiras de jornais sobre o crime e as análises de Dupin em cima do que dizem os jornais e testemunhas; são páginas e páginas de agrupamento das pistas, muitas delas erradas (de propósito ou não) seguidas de longas ponderações de Dupin. O texto é bom, mas cansa tanto que cogitei largar o livro.

O que gostei
-Vocabulário rico e gostoso de ler
-Frases muito bem montadas, estilo de escrita estupendo.
-Crimes bem pensados e soluções surpreendentes
-Personagens bem descritos, ainda que Dupin e as vítimas monopolizem a atenção

O que não gostei
-O segundo conto, apesar de ser bom, é exageradamente parado, deixando várias oportunidades para um leitor não muito motivado abandonar a leitura.

Considerações finais
A trilogia Dupin é um ótimo livro, mas que o leitor precisa saber primeiro o que vai encontrar, para evitar um susto com a narrativa, que é intensa, especialmente se comparada com os livros policiais "normais", que somam mistério, ação e um pouco de aventura ao pensamento analítico, que é absoluto nesta obra de Edgar Allan Poe.



domingo, 12 de outubro de 2014

Impressões: Revista Trasgo #4


Fechando mais uma leitura da revista digital Trasgo, deixo aqui minha opinião - curta, mas sincera - sobre os contos presentes na última edição, de número 4. Vale lembrar que achei alguns erros de digitação nesta edição; não lembro de ter visto isso nas anteriores, mas mesmo assim foram apenas 3 ou 4, nada que prejudique a leitura.

Trasgo 04 - Capa - mini

O conto que abre a edição é de autoria de Gerson Lodi-Ribeiro e se chama Rendição do serviço de guarda. Esse é o conto mais longo da revista. Pelas palavras do autor, somos puxados para um universo futurista onde a ideia dos deuses astronautas é uma realidade, juntamente com um tipo de darwinismo galáctico que descambou na inevitável guerra entre dois grandes grupos de espécies de seres vivos inteligentes. A construção do conto é muito focada no cenário, relacionando a linha de tempo de alguns personagens com o desenvolvimento da raça humana na Terra, e aproveitando esse momento para expor algumas discussões filosóficas interessantes. O espaço para dar andamento ao enredo acabou sendo muito curto, se comparado ao texto do worldbuilding, mas foi executado de forma coerente e satisfatória, apresentando o problema e a solução sem muitos rodeios. Por não ser fã de FC Hard, demorei um pouco para engrenar a leitura, devido ao começo ser bastante puxado no gênero, mas depois da metade a escrita se torna bem mais rápida. Recomendo, principalmente para os fãs de FC hard.

O conto seguinte é Vivo, Morto. X.,  de Érica Lombardi. Uma história curta, urbana e, em certo grau, abstrata. Conhecemos Guilherme, um cara babaca, mas de bom coração, que topa com uma criatura sobrenatural prontinha para atormentar sua cabeça com um jogo psicológico muito perigoso. A fantasia sobrenatural do conto gira em torno da criatura, que aparece sobre a forma de uma garota chamada Ana, e desaparece assim que ela sai de cena. A autora tem uma voz bem pessoal, vale a pena memorizar o nome para uma busca futura.

O terceiro conto é Isaac, de Ademir Pascale, e foi para mim a grande decepção da revista. Cenário clichê, cenas despropositais e que não fazem sentido definem o conto. O lado bom é que o autor tem uma habilidade monumental em criar suspense, e eu acabei me interessando e lendo mais e mais, mesmo com as incongruências que apareciam a todo momento. Os elementos do conto também mostram que o autor sabe escolher peças-chave para montar uma história cativante, como o cenário apocalíptico e os habitantes com seus costumes hediondos, mas a falta de algum trabalho para diversificar esses elementos deixou tudo muito na mesmice, e os furos de roteiro deixaram a impressão de ser uma leitura para adolescentes, nada além disso.

Mary C. Muller escreve o conto seguinte: Estive assombrando seus sonhos. Conhecemos Felipe, um garoto com mediunidade, e sua rotina de convivência com fantasmas, vampiros e afins num magnífico conto infantil. O enredo trata de uma alma penada que aparece pedindo socorro de uma maneira diferente, e o garoto logo precisa da ajuda de outros seres sobrenaturais para resolver o problema da garota-fantasma. Com exceção da caracterização de Felipe com sua família e cotidiano "humano" no início do conto - que achei de um tom negativo, maduro e desnecessariamente complexo - a história é sensacional, muito divertida e recomendada para qualquer um acima de 8 anos.

O conto seguinte é Arca dos Sonhos, de Fred Oliveira. Confesso que não gostei muito, mas a escrita do autor é muito refinada; o enredo é que não tinha uma intenção muito clara do que pretendia passar. Embarcamos numa space opera com um tom de "aventura naval" bastante óbvio e emocionante, mas sem muito sentido. A tal arca parte com sua tripulação que faz parte de si, integrada mental e organicamente pela tecnologia, em busca de um destino que não se deixa claro o quê (nem para o leitor nem para os personagens), encabeçada pelo capitão sonhador, que se mantém fiel à sua vontade de realizar seu desejo nem que precise passar a eternidade inteira na busca. Talvez tenha faltado algumas páginas para estender mais o enredo e esclarecer uma coisinha ou outra, porque de resto, o conto é muito bom.

Fechando a revista com chave de ouro, Jessica Borges nos apresenta No labirinto. Conto de fantasia onírica, que já deixei claro no post da Revista Trasgo #3 ser um tema que gosto DEMAIS, que nos leva ao dia-a-dia de Sarah, ou melhor: apenas a parte do dia em que ela está dormindo. Com uma trama inspirada em um filme que eu nunca vi, Jessica desenvolve um lado emocional de maneira espetacular, com um enredo simples e direto, uma linguagem que prende o leitor e uma habilidade maravilhosa de surpreender. Nota 10, parabéns para a autora.






sábado, 4 de outubro de 2014

Minha vida (de leitor) comparada



Um texto rápido só para cortar a enxurrada de resenhas postadas consecutivamente, e o assunto é a interação leitor-resenhista-autor. Recentemente entrei num grupo de resenhistas, com intuito de fomentar a produção nacional resenhando e divulgando títulos independentes, e até agora tudo tem dado certo, mais até que o imaginado, e as intenções são de melhorar ainda mais. Neste grupo, passei a ter contato não só com a resenha, como se dá lendo um blog ou caderno de jornal, mas também com o resenhista, e olhando o processo de análise e redação de cada um - são vários, é bom lembrar - pude fazer uma análise do meu próprio estilo de resenhar.

A primeira questão a se apontar é logo a mais polêmica: notas são necessárias? Para alguns, sim, para mim, não. A resenha serve para avaliar o livro em vários aspectos e concluir se vale indicar ou não a leitura. E tudo isso se expressa no próprio texto da resenha. Dar uma nota com base no que se diz ser “um fechamento” da resenha, para mim, é um despropósito, uma vez que o fechamento serve para considerar tudo que foi dito, e um número não é capaz de fazer isto. Mesmo considerando notas isoladas para cada critério de avaliação, o numeral não faria jus ao livro. Como exemplo, vamos imaginar que nota seria dada apenas no critério ‘Personagens’ nos seguintes casos: O livro chega no clímax com uma mãe doando um órgão para o filho necessitado. O livro remete ao amor da mãe em diversas passagens no livro, sejam longas ou curtas, densas ou triviais, sempre enaltecendo o amor que sente pelo filho, sem haver no enredo uma cena emblemática que evidencie esse amor maternal tão pujante.

Muitos resenhistas que vejo, não necessariamente os que fazem parte do grupo citado anteriormente, considerariam uma dessas expressões do autor como tendo qualidade e a outra não, no que tange a desenvolvimento da personagem Mãe. O ponto de vista do resenhista não é o importante, ele pode exaltar o segundo caso ou o primeiro, o leitor da resenha vai analisar a opinião e decidir se concorda com o critério desenvolvimento de personagem. Mas quando existe uma nota para o critério, a coisa muda. Se o resenhista a aprecia livros que se encaixem no caso 1, terá que dar uma nota baixa caso o livro lido apresente o caso 2, e vice-versa. E o parâmetro do leitor passa a ser a nota, sem saber realmente se aquele numeral representa a qualidade do livro individualmente ou num contexto comparado. Claro, há a justificativa de que a nota é só um complemento, mas como pode ser um complemento à resenha, algo que restringe o seu entendimento?

A segunda e última coisa que quero deixar registrada aqui no post é, sim, bastante associada ao grupo que faço parte. É a relação autor-resenhista. Ao meu ver, a resenha é a visão de quem escreve, e num contexto ideal, deveria refletir fidedignamente a impressão do leitor-resenhista. Quando se lê um autor estrangeiro ou falecido, há uma razão para não incluí-lo na equação da resenha, mas no meu caso, que estou fazendo resenha de um livro nacional, e ainda por cima independente, o contato com o autor é algo não só possível, mas recomendado! Por não ter prazos a cumprir até que a edição seja impressa, eu como resenhista me sinto à vontade para redigir calmamente, e buscando o autor para uma conversa livre sobre a obra. E não é isso que vejo em 99% dos leitores, blogueiros, jornalistas e vlogueiros literários; há uma aura sagrada que limita a percepção do resenhista sobre a obra exclusivamente nas palavras do livro. É um pecado capital evitar o autor para emitir uma opinião “livre de influências”, como se o autor, num bate-papo sobre seu livro, só possa ser desonesto ao ponto de passar informações de maneira a manipular o andamento da resenha? Não, assim como o inverso também não é pecado algum. Em minhas análises, me sinto satisfeito em dizer que já consultei autores nacionais quando da elaboração de resenha para um de seus livros. E em livros internacionais, se houver a oportunidade, também farei. Acredito que este seja um traço de orgulho para mim, pois evito preâmbulos introspectivos, buscando em mim respostas para minhas próprias perguntas, e ainda incremento um pouco de honestidade da resenha, já que o leitor pode ter uma informação do livro dada pelo autor, e que talvez eu não fosse capaz de captar na leitura.

Por hoje é só, e que venham para minha lista de leitura mais livros escritos por autores amigáveis.

Casos de informações que consegui através das autoras Vanessa Nilo e Lívia Stocco, em livros já resenhados aqui no blog:






sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Impressões: Revista Trasgo #3


Cá estamos com a terceira edição da Revista Trasgo. Confesso que houve certa decepção durante a leitura; ainda que ao final meu veredito seja positivo, alguns contos desta edição não me cativaram como eu esperava, especialmente se a leitura for comparada às edições #1 e #2. O formato é o mesmo: fiquem com a capa e as minhas breves considerações sobre cada conto.

cover_mini


O primeiro conto que li foi Rosas Brancas, de Roberto de Souza Causo e já iniciei a edição fora da zona de conforto. Meu gosto para ficção científica é bastante restrito, prefiro quando o texto se mantém ficção científica a quando se apresentam mais como ciência ficcional, se posso assim diferenciar. A narrativa do autor é muito bonita, com toques de poesia aqui e ali, e a trama se desenvolve agilmente com pitadas de amores destruídos (maternal e conjugal). Mas aí vem a ciência especulativa, cheia de termos e extrapolações que particularmente vejo como o floreio desnecessário nas histórias futuristas (mas, como diz uma amiga minha, fazer o quê?). Aos apreciadores desse tipo de inserção tecnológica em histórias, provavelmente o conto será muito bem vindo com a sua temática orgânico-cibernética.

Retornei ao início do ebook para ler o primeiro conto da edição: O empacotador de memórias, de Gael Rodrigues. O meu motivo para ter pulado o conto é bastante particular: eu tenho um problema de falta de memória, e é muito, muito raro (mas não impossível) eu acabar gostando de histórias com esse tema, justamente por tratar de um tema que afeta bastante (negativamente, devo frisar) a minha vida. O conto mostra a infância e vida adulta de um homem solitário que descobriu como guardar memórias em bolhas de sabão e caixas de papelão. A escrita é bem tranquila, mas a narrativa exige algumas abstrações, fazendo o leitor se perguntar o significado de uma memória e o que ela afeta o que ele é ou já foi na vida. O final achei bem intrigante.

Feita de um sonho é o terceiro conto da revista, e é de autoria de Caroline Policarpo Veloso. Este conto foi o que me impulsionou a continuar lendo, ao invés de desligar o Kindle e postergar a leitura (algo que faço muito quando leio coletâneas de contos). O tema me afetou de maneira oposta à leitura anterior, uma vez que eu sou um onironauta (ainda que tenha poucas viagens completadas com êxito) e falar sobre sonhos - lúcidos principalmente - é algo que gosto muito. Caroline me presenteou com uma escrita super fluída e uma história com um ritmo sensacional que nos faz pensar sobre a correria cotidiana, nossas inseguranças (in)conscientes e a importância que um sonho pode ter na vida pessoal. O aspecto fantástico do conto acabou ficando diluído, sem tanta importância, mas no final a dose de fantasia foi incrementada, deixando-me satisfeito. Infelizmente fiquei com a sensação de que o conto ficou inacabado; não sei se a autora pretende expandir essa história, mas se acontecer,.com certeza é algo que eu comprarei.

Pulei novamente a ordem da revista para o conto Viral, de Tiago Cordeiro. A história nos mostra uma abordagem diferente sobre uma infestação zumbi, e apesar de achar muito criativa a forma que ele deu à essa infestação, o transcorrer da história não me agradou. atribuições matemáticas e sonoras aparecem no conto junto a vários outros elementos jogados num enredo corrido e inconclusivo. Não chamaria de formal, mas a escrita do autor me pareceu automática, e, sem ser cativado, terminei a leitura sem muita vontade de pensar sobre o que tinha acabado de ler.

Voltei para páginas anteriores e encontrei Invasão, de Cláudio Parreira. O texto é simplesmente GENIAL, comédia sensacional que eu não posso falar muito a não ser dizer que é foda e que me diverti bastante lendo. Gostei tanto da trama quanto da escrita do autor, mas para não dizer que só falei bem, me sinto na obrigação de informar uma coisa ao autor: Regiane Alves>>>>Bruna Lombardi.

Para finalizar, o conto O vento do oeste, de Liége Báccaro Toledo. Uma história de fantasia com inspiração nos mitos árabes e ambientação desértica, onde conheceremos parte da vida de um mestiço que busca um lugar onde sua descendência demoníaca não seja motivo de ódio e rejeição. O enredo é legal, mas muito centrada no desenvolvimento do personagem e, até a parte mais avançada, sem muitos motivos externos para fazer a trama seguir. Felizmente a escrita da autora é simples e estimulante, o que compensou a minha vontade de fazer pausas e pude terminar de ler sem interrupções.


A edição #4 já está disponível NO SITE e comecei a ler hoje cedo.  =)


Impressões: Bukowskianos, de Murillo Magaroti


No embalo da leitura, vou quebrar minhas regras textuais e fazer a resenha ao estilo Bukowskiano. Nada de tópicos com pontos positivos ou negativos – fazer o quê? Gosto de listas, e você também, aposto! Em Bukowskianos, Murillo Magaroti oferece um verdadeiro trabalho de fã, e isso não é só evidenciado no título; segue a sinopse:


Bukowskianos traz 43 pequenos contos que falam principalmente de gente sem muito brio, bebidas, escritores e da complexidade em tudo na vida. São contos que passeiam pelo mundo da crônica e que fazem inúmeras referências à obra do escritor Charles Bukowski.

Não só a temática que se assemelha, a estruturação gramatical é constantemente voltada à quebra de regras, gerando um texto amorfo que preza a liberdade para o autor e do leitor. O que obtemos disso é uma leitura ágil, fácil e bastante coloquial, que muitas vezes consegue estapear o leitor no rosto e dizer ESTÁ VENDO? VOCÊ SE IDENTIFICOU COM ISSO, NÃO FOI, SEU VAGABUNDO?!

O estilo de Magaroti é claramente mais que inspirado, é uma simulação de Bukowski. Isso pode ser recebido de duas formas. A primeira é a falta de voz do autor, o que pode ofender os de coração mais romântico e artistas por natureza, ainda que não por profissão. A segunda – que deixo claro ser a minha visão – é que, ainda que mimética, a escrita é MUITO BOA; Bukowski era autêntico e escrevia bem, então é apenas normal confirmar o mesmo de Bukowskianos. Como já falei acima, o texto é muito bem trabalho tanto em temas quanto em estilo, vai ser muito difícil um fã do autor consagrado não gostar desta obra de Murillo.

Para não dizer que não vi nada de errado na minha leitura, achei que o pessimismo e a ebriedade das histórias sempre ficavam um pouco atrás da obscenidade, que era sim um traço marcante de Bukowski, mas ele não era só isso. Talvez seja só uma questão de dosagem.

No final das contas, Bukowskianos é um excelente trabalho, notável por ser o primeiro de Murillo Magaroti. Recomendo o livro a putas e vagabundos de todos os calibres.



sábado, 6 de setembro de 2014

Impressões: Mistborn - O império final, de Brandon Sanderson


O livro de hoje pulou na frente de muitos livros da lista de leitura, devido à quantidade exorbitante de indicações e de fãs e prêmios exaltando a maravilha que é. Infelizmente ninguém dizia que o livro é um juvenil/YA, e enquanto lia, minhas expectativas eram satisfeitas e não atendidas ao mesmo tempo, deixando a minha visão do livro bem inconstante. Vamos à sinopse:

O Império Final

O que acontece se o herói da profecia falhar? Descubra em Mistborn! Certa vez, um herói apareceu para salvar o mundo. Um jovem com uma herança misteriosa, que desafiou corajosamente a escuridão que sufocava a Terra. Ele falhou. Desde então, há mil anos, o mundo é um deserto de cinzas e brumas, governado por um imperador imortal conhecido como Senhor Soberano. Todas as revoltas contra ele falharam miseravelmente. Nessa sociedade onde as pessoas são divididas em nobres e skaa – classe social inferior –, Kelsier, um ladrão bastardo, se torna a única pessoa a sobreviver e escapar da prisão brutal do Senhor Soberano, onde ele descobriu ter os poderes alomânticos de um Nascido da Bruma – uma magia misteriosa e proibida. Agora, Kelsier planeja o seu ataque mais ousado: invadir o centro do palácio para descobrir o segredo do poder do Senhor Soberano e destruí-lo. Para ter sucesso, Kel vai depender também da determinação de uma heroína improvável, uma menina de rua que precisa aprender a confiar em novos amigos e dominar seus poderes.


A trama é bastante simples e extremamente rápida, como é de se esperar num livro juvenil. Nós acompanhamos Kelsier na sua luta, em um mundo apocalíptico dominado por brumas noturnas que abrigam mistérios e criaturas medonhas, contra um império maligno dominado pelo Senhor Soberano. O imperador, além de poderoso e imortal, mantém com mãos de ferro a sua sociedade feudal, em que nobres vivem em opulência enquanto a maioria da população é escrava e tratada como escória, seja no campo ou nas regiões urbanas. Tomamos conhecimento da vida de Kelsier como golpista e de seu grupo de companheiros vigaristas, empenhados na maior de todas as empreitadas: destruir o Império Final. Apesar de contar com um narrador impessoal, o leitor basicamente lê um livro de diálogos, pois é assim que toda a história transcorre, sem muita descrição ou narrativa, que, quando acontecem, são usadas, respectivamente, na apresentação inicial do ambiente da cena em que acontecerá o diálogo; e nas passagens de batalhas.

O elemento condutor da fantasia é a alomancia, uma alquimia metabólica que permite ao seu usuário - necessariamente descendente de nobres - retirar habilidades mágicas de metais absorvidos pelo corpo, e quando digo absorvidos, falo INGERIDOS no maior estilo EAT-MAN. Cada metal alomântico possui um tipo magia e o sistema de utilização é o mesmo de jogos de rpg, gastando "mana" até que precisem ser ingeridos novamente, e a intensidade do consumo pode ser dosado ao bel prazer do alomântico, o que contribui para o maior defeito do livro: a repetição.


Existe um problema sério de escrita, a repetição de palavras e expressões é a maior que já vi em qualquer livro. QUALQUER LIVRO. Na primeira página já se percebe isso, mas o problema vai mais longe: a condução da história é bastante didática, e constantemente vemos ideias e sensações sendo re-explicadas e reforçadas desnecessariamente, mesmo para um livro juvenil, e você se pega várias vezes tendo que ler de novo o quanto Vin é desconfiada de todo maldito novo personagem que entra em cena, ou do tamanho do poder do Senhor Soberano, ou a odiosidade que é a vida dos skaa (casta de escravos). Isso tudo somado ao "empurra e puxa" (termos de alomancia) constante para descrever minuciosamente cada ação dos alomanticos, mesmo depois do leitor já ter conhecimento do que se pode ou não estar sendo feito, deixou a história extremamente longa e cansativa. Se o autor já explicou que queimar peltre dá superforça, então se alguém usa superforça, é lógico que ele está queimando peltre, não precisava indicar isso em todo fucking movimento!

Essa parte da escrita de lado, o livro se mostra bastante agradável. Os cenários são bem montados, a escrita é sensacional, sendo bem direta e simples, o que é um favor que Mistborn faz à literatura de fantasia, que ainda se apega DEMAIS à uma construção poética e elaborada, que muitas vezes até prejudica o andamento do enredo. Os personagens são poucos e bem definidos, não dá para se confundir; pela quantidade de diálogos, o leitor logo pega os traços de cada um. Por um momento o autor até dá a impressão que vai tratar de temas mais sérios, citando Deus e os conceitos de bem e mal, mas a trama gira mesmo em função da rebelião dos escravos, e durante centenas de páginas o leitor vai descobrir esperança e conformismo, luxo e miséria, trapaça e inocência em Luthadel, a capital do império.

O que gostei:
- Personagens marcantes.
- Cenários envolventes.
- Enredo cativante, com algumas reviravoltas.
- Escrita ágil, fácil de prender o leitor.

O que não gostei:
- Escrita muito prolixa, o livro caberia facilmente sem retirar fatos do enredo, em menos de 400 páginas.
- Repetição demasiada de termos e ideias.

Considerações finais:
Mistborn é uma história agradável, porém cansativa. O estilo do autor favorece a velocidade de leitura, mas em contrapartida o montante a ser lido anula essa qualidade. A revolução de Kelsier começa e termina no livro, então a leitura é válida mesmo para quem não curte trilogias/séries. Não acho que vou ler os próximos, pelo mesmo motivo que deixei de ver animes, e é isso que Mistborn é: um anime transposto para 600 longas páginas.



domingo, 31 de agosto de 2014

Impressões: Frankenstein, de Mary Shelley


O livro de hoje é um clássico da literatura de terror, que admito não estar nas minhas listas de leitura até pouco tempo atrás, mas minha atenção foi conquistada após ouvir um PODCAST SOBRE A OBRA. O livro tem um ar muito mais romântico do que normalmente se pode esperar de um livro de terror, e especificamente sobre o Monstro (conhecido na cultura pop como Frankenstein) difere bastante do gigante abobalhado com parafusos no pescoço que normalmente se vê por aí.


A história começa com uma troca de cartas entre dois irmãos, Margaret e Walton, durante uma viagem deste nas regiões gélidas do ártico. Após algumas cartas, Walton descobre Victor Frankenstein desolado no meio do gelo, em situação de saúde lastimável. O homem é resgatado e, após se recuperar, conta seu passado, desde um jovem apaixonado pelas ciências naturais até os dias de tormenta que passou depois de ter criado o horrendo Monstro, ato que se torna eterna fonte de arrependimento e agonia desde que ouviu o primeiro urro da sua criação. Embora a história foque o passado de Victor, acabamos tomando conhecimento sobre os rumos tomados pelo Monstro, e descobrimos que ele é - se torna, na verdade - um ser pensante, eloquente e bastante razoável; entretanto sua aparência horrenda o condenou viver em sofrimento e solidão.

É importante destacar o peso que a aparência tem na tragédia do Monstro e como isso gerou toda a sequência de infortúnios. O medo de alguém que é jogado numa cela com um leão provém da impotência diante da fera, diferentemente do medo de alguém que é jogado na mesma cela tomada por baratas. O Monstro podia instilar os dois tipos de medo, porém fica claro que a repulsa que sentem por ele é tão somente graças à sua aparência nojenta, ao passo que em certo momento da história, o Monstro é acolhido por uma única pessoa: um cego. Análogo à essas duas formas, Victor era assombrado por um terceiro e mais opressivo terror: o de ter condenado a humanidade à viver sob a ameaça do Monstro.

Raiva, tristeza e ocasional esperança são os traços mais fortes que senti na leitura, e todos esses sentimentos são apresentados tanto em Victor quanto no Monstro, por diferentes razões. A escrita é bastante poética, deixando o texto denso em sua maior parte e dando um ar de teatralidade às cenas. Muitos atribuem um aspecto religioso muito presente no livro, o que não me marcou tanto assim. Talvez por eu ter lido a edição de 1831, ao invés da original de 1818, algumas coisas tenham ficado de fora, mas pelo que percebi, a presença da religiosidade se dá em instâncias normais de livros clássicos - especialmente de terror - que já não é tão fácil de se implementar devido ao materialismo científico que vivemos hoje em dia.

O que gostei:
- A escrita quase teatral, ainda que três ou quatro vezes eu tenha me distraído nas divagações melodramáticas.
- Cenas bem montadas.
- Personagens convincentes e bem definidos.

O que não gostei:
- No final da história eu estava ávido para descobrir o desfecho e tinha que aturar pela enésima vez as lamúrias de Victor. Ainda que a escrita fosse boa e coesa com as passagens anteriores, eu me peguei desejando pular as ponderações tristonhas dele para continuar com os fatos seguintes.

Considerações finais:
Frankenstein foi uma experiência gostosa de se ler. Não vai dar susto em ninguém e a escrita refinada talvez diminua o terror do enredo para valorizar a tragédia vivida pelos personagens, mas ainda assim, um dos melhores materiais de terror que já li (lembrando que nunca fui entusiasta do gênero). Ironicamente eu li uma edição em inglês (não tive problema algum com o entendimento, ainda que muitas palavras e construções de época me soassem estranhas) e no livro há referência ao fato de que só aprendendo outras línguas e lendo seus autores, alguém pode se considerar verdadeiramente letrado.